Comissária de Bordo – História da Profissão

comissária

Quando os aviões começaram a oferecer serviços comerciais na década de 1920, o espaço limitado a bordo tornava quase impossível a presença de uma comissária de bordo. Os pilotos eram responsáveis por atender os passageiros, fornecendo um “serviço de bordo” que muitas vezes se limitava a chicletes (para equilibrar a pressão nos ouvidos), grandes pedaços de algodão (para proteger os ouvidos do ruído dos motores) e sacos de enjoo feitos de papel encerado e, posteriormente, de plástico.

Comissária de Bordo – História da Profissão

Algumas empresas contratavam atendentes, geralmente adolescentes ou pessoas de baixa estatura, para acalmar os passageiros nervosos, ajudar com as bagagens e auxiliar no acomodamento das pessoas. Esses tripulantes eram sempre do sexo masculino e tinham pouco ou nenhum treinamento específico, trabalhando apenas nas maiores aeronaves. Era comum que o copiloto assumisse ambas as funções. As empresas Daimler e Stout foram as pioneiras na contratação desses tripulantes a partir de 1922.

Foi em 1930 que a profissão de comissário de bordo começou a adquirir a forma que conhecemos hoje. A mudança aconteceu graças à enfermeira britânica Ellen Church. Ela sonhava em se tornar piloto de avião, mas ao perceber que não seria contratada por ser mulher, propôs à Boing Air Transport que enfermeiras fossem colocadas a bordo para cuidar da saúde dos passageiros. Naquela época, as aeronaves não eram pressurizadas, voavam em altitudes baixas, em condições turbulentas e eram muito barulhentas. O nervosismo dos passageiros era um problema sério.

Ellen Chuch - Comissária

 

A experiência foi bem-sucedida e outras companhias aéreas logo imitaram a iniciativa. Como contratar apenas mulheres não era ideal, especialmente em uma época ainda bastante “machista”, muitos homens também foram contratados, especialmente pelas empresas europeias, e em pouco tempo não foi mais exigida a qualificação de enfermagem para exercer a profissão. A exigência de baixa estatura e baixo peso, no entanto, permaneceu até o final da década de 1950, quando as empresas começaram a utilizar jatos.

As primeiras oito comissárias de voo foram: Ellen Church, Margaret Arnott, Jessie Carter, Ellis Crawford, Harriet Fry, Alva Johnson, Inez Keller e Cornelia Peterman. Todas enfermeiras.
As primeiras oito comissárias de voo foram: Ellen Church, Margaret Arnott, Jessie Carter, Ellis Crawford, Harriet Fry, Alva Johnson, Inez Keller e Cornelia Peterman. Todas enfermeiras.

Ellen Churh – A primeira comissária

O primeiro voo das comissárias, com Ellen Church a bordo, ocorreu em 15 de maio de 1930, partindo de Oakland, Califórnia, com destino a Chicago, Illinois. A jornada durou incríveis 20 horas e incluiu 13 paradas ao longo do caminho.

Ellen Church trabalhou como comissária na Boeing por apenas 18 meses. Infelizmente, um acidente de carro a afastou dos voos e da empresa. Ela retomou sua carreira como enfermeira, mas sua relação com a aviação ainda não havia chegado ao fim. Durante a Segunda Guerra Mundial, ela serviu como enfermeira de voo no Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos e recebeu a Medalha Aérea por seus serviços prestados na Europa e no Norte da África durante o conflito.

Após a guerra, Ellen se estabeleceu como enfermeira em Terre Haute, Indiana. Em 1964, aos 60 anos de idade, ela se casou com Leonard Briggs Marshall, presidente do Terre Haute First National Bank. Infelizmente, apenas um ano depois, em 22 de agosto de 1965, um mês antes de completar 61 anos, ela faleceu após cair de um cavalo.

aeroporto municipal de Cresco

Comissária no Brasil

Somente após a Segunda Guerra Mundial é que as companhias aéreas no Brasil começaram a contratar comissários, embora algumas empresas tenham realizado experimentos com esses tripulantes nas décadas de 1930 e 1940.

As pioneiras na contratação de comissários foram a Varig, a Real e o Lóide Aéreo. A Varig inicialmente contratava apenas homens, enquanto a Real e o Lóide empregavam muitas mulheres nessa função. A Varig só passou a contratar mulheres quando se preparava para iniciar voos internacionais para Nova York, em 1954. Os aviões usados nessa rota, os Lockheed Super Constellation, possuíam leitos para os passageiros, e não era apropriado que comissários do sexo masculino atendessem mulheres e crianças nesses leitos. Com o tempo, as mulheres passaram a predominar na profissão.

Primeiras Comissárias da Varig - 1960

Uma das primeiras comissárias pioneiras da Varig, Alice Editha Klausz, era bibliotecária até que a Varig anunciou que contrataria comissárias em 1954 para atender a rota de Nova York. Como era uma rota internacional, a empresa exigia que as candidatas dominassem pelo menos dois idiomas, o que era muito raro na época. Após ser aprovada em rigorosos testes, Alice começou a voar pela Varig e foi encarregada pessoalmente pelo presidente da Varig, Ruben Berta, de escrever todos os manuais utilizados pelos comissários. Ela recebeu um escritório completo e várias datilógrafas para realizar essa tarefa.

Alice Editha Klausz - Primeira Comissária Brasileira
Alice Editha Klausz – Primeira Comissária Brasileira

Alice se aposentou da Varig após 35 anos de serviço, em 1989, mas sua carreira como comissária de voo estava longe de terminar. A pedido de um amigo, ela se candidatou para a função no Programa Antártico Brasileiro (Proantar).

Alice foi aprovada e passou a atuar como comissária de voo nos aviões Lockheed C-130 Hércules da Força Aérea Brasileira, responsáveis pelos voos para o continente gelado. Alice se tornou a comissária de voo com mais tempo de serviço no Brasil e possivelmente no mundo todo. Também foi a tripulante civil mais idosa do Brasil.

“Tia” Alice, como gostava de ser chamada, tratava seus passageiros nos C-130 de forma extremamente carinhosa e se tornou uma verdadeira lenda. Ela realizou mais de 150 voos, que duravam pelo menos 20 horas cada um, de ida e volta. Essa era uma atividade voluntária e não remunerada, e ela sobrevivia apenas com sua aposentadoria. No entanto, “tia” Alice considerava-se feliz e privilegiada por realizar esse trabalho.

Alice faleceu em 20 de julho de 2016, aos 88 anos de idade. Ela partiu no mesmo dia em que se comemora o aniversário de Santos Dumont, o 47º aniversário do primeiro pouso na Lua e, coincidentemente, os dez anos do fim da Varig.

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Diploma Mulher Cidadã Bertha Lutz

Nos últimos anos de sua vida, Editha recebeu o Diploma Mulher Cidadã Bertha Lutz, concedido pelo Senado Federal, em reconhecimento a sua longa e frutífera trajetória. Essa honraria é um testemunho do impacto significativo que Alice teve como comissária de voo e sua dedicação exemplar ao longo dos anos.

A comissária em seu oitavo voo a bordo de um Hércules (C130) da FAB rumo à base chilena Presidente Frey. Este era seu 156º voo à Antártida.

Alice Editha Klausz deixou um legado duradouro na aviação brasileira. Sua coragem ao entrar para a profissão em seus primórdios, seu comprometimento em ajudar os passageiros e sua paixão pela aviação são exemplos inspiradores. Ela abriu caminho para outras mulheres ingressarem nesse campo e contribuiu para a evolução da profissão de comissário de bordo no Brasil.

Sua história é um lembrete de que o trabalho árduo, a determinação e o amor pelo que fazemos podem deixar um impacto duradouro nas vidas das pessoas ao nosso redor. Alice Editha Klausz será sempre lembrada como uma pioneira da aviação brasileira e uma figura admirável na história da profissão de comissária de voo.

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